domingo, dezembro 17, 2006

Saudade I


Às vezes tenho saudades de te escrever. De te olhar de papel na mão, os olhos verdes e espertos debruçados sobre um abismo de letras, que te deixavam desamparada. Ora pelo desafio de beleza que as palavras te tentavam, ora pela angústia das palavras mais cruas. Era sempre assim, eu escrevia-te cartas como se a caneta fosse um bisturi que abrisse a alma pelo meio do esterno. As visceras e a pele nas tuas mãos. Às vezes era o teu sorriso tímido entre a mão que levavas à boca, noutras o olhar sério sobre a folha que seguravas directo aos meus olhos, como uma interrogação ou um prenúncio de discussão. Quantas vezes não era um brilho nos olhos, que humedecia e brilhava mais ainda... até cair uma lágrima. Lágrimas de emoção, tinhas lágrimas de emoção nos olhos, e raramente choraste. Isso sim, foi a nossa grande poesia. Às vezes tenho saudades de te ver ler as asneiras da minha imaginação, saudades de abrir a janela da alma, de fazer um d(i)ário de coisas que soubeste juntar, guardar folha a folha. Às vezes tenhos saudades de ser quem eu era, de ser quem eu para ti fui.

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